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3 de fevereiro de 2010

diário de uma ex-fumante - primeiro dia



Sentia que me devia uma divida sangrenta e que um dia, teria que doar meus pulsos e meu sangue, mesmo podre.

Não foi aquelas promessas de final de ano. decidi por livre e imposta pressão parar de fumar. Larguei, abandonei e joguei na lata do lixo, com dó e muita piedade.
Por recomendação (médica) escolhi uma data para largar a nicotina, - sim, pois o vício acho que a gente nunca perde - as semanas passaram quase que em duas piscadas. Impressionante.

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dia 31 de janeiro, perto da meia noite fumei meu último e solitário cigarro. apaguei a luz da sala, deixei o Ricardo na cama, sentei no sofá e fumei, acho que como nunca antes. Olhei, namorei e desejei que não acabasse. Queria que fosse maior e que não queimasse tão rápido. Senti pela última vez (assim espero!) o gosto da fumaça entrando garganta a dentro , feito estupro – abusando de toda a minha boca e pulmão, mas com o meu consentimento. Ao soltar a fumaça senti como se estivesse gozado pela primeira ou quem sabe última vez. definitivamente não vou esquecer.
No dia seguinte foi angustiante. Já dormi com o tal do adesivo que injeta nicotina pelo sangue, para que pela manhã não matasse o primeiro que visse pela frente – Ricardo.

Adiantou nos primeiros 40 minutos. Mudamos a rotina, abandonei o café preto e o sofá. Tomei para mim a mesa da sala, com toalha, pão, leite, cereal, nata e queijo. Tomei o remédio indicado pelo médico + o floral (calmante).
Não durou mais que 1h o meu sossego.
Foi angustiante, parecia que não era eu que estava no corpo. ele estava vazio. vazio de quem eu sou e fui.

Eu fiquei sozinha. a betina – minha cachorra, uma beagle muito linda e gostosa – nunca passeou tanto na vida em um único dia.

talvez se o Ricardo não tivesse levado com ele os cartões do banco e todo o dinheiro da casa e da minha bolsa – eu tinha comprado uma carteira e fumado os 20 em uma tacada só.


única foto que achei minha fumando - essa faz tempo


dormi boa parte da tarde. nada resolvia a falta do cigarro. chegava a colocar a mão involuntariamente ao lado do sofá, em cima da TV, na mesinha – todos lugares que ele adorava repousar.

tomei um banho, desci mais uma vez com a betina, adotei como mais novo integrante da minha boca – aquele lacre de plástico que rompe quando abrimos uma garrafinha de água mineral – que fica agarradinho com a tampa. Aquela argolinha de PET eu corto e fico mordendo o dia inteiro, tomei dois banhos, tomei mais água e nada.

a vontade de fumar era quase que sufocante. quando o Ricardo chegou estava pronta e no estilo ginasta do ano. Caminhamos 6km. foi relaxante – por uma hora não pensei no cigarro.

após cada refeição dá vontade de estrangular a mim ou qualquer outra coisa que respire. ou ainda parar de comer. essa seria uma solução inteligente.

O fim do primeiro dia foi assim.
meio tranquilo, meio turbulento.
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O bom mesmo é quando estou dormindo.

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